quinta-feira, 28 de agosto de 2008

MULHER PRETA

Ilustração "Mulher Negra Raiz da Vida", Pavão Mc.


"Jóia rara, aquela mina preta, Dandara
Minha mente não para de fazer versos a realeza
Africana beleza, que me dá a certeza que foi o próprio Jhá quem esculpiu as sutilezas do seu corpo,
Deusa de ébano, o Ilê Aiê já cantou,
Eu sei o seu valor, por isso canto o amor dessa menina mulher da pele preta
Incrível, mas ainda tem rainha que não se aceita,
Tudo bem, eu sei que zuaram demais a nossa cabeça
Mas se liga, não importa o que a tv te diga,
Você é linda e por você eu compro briga!
Sem essa de "a cor do pecado"
O seu cabelo crespo, enrolado me deixa obcecado pra me prender nos emaranhados de suas madeixas,
Então me deixa tocar na sua pele,
Que o sol da mãe África queimou a muito tempo atrás,
Seus braços são como um cáis seguros nessa vida loka
É o conjunto de nariz, olhos e boca que me fascina!
Negra mulher a tua história me ensina
Acho que me apaixonar por você é a minha sina,
Porque isso é simplesmente uma questão de gosto pela melanina!"


A todas as Dandaras,
As verdadeiras guerreiras que estão na capa da revista caras
Nagôs, Malês, Ijexás ou Cabinda, tua energia vira pura poesia como nos versos de Elisa Lucinda
É bem vinda a sabedorira que você trás
O axé dos orixas que você ensina é como a ancestralidade de Makota Valdina
Abolicionista como Adelina e Maria Firmina dos Reis
É como a liderança de Aqualtune em Palmares e a coragem de Luiza Mahin na Revolta dos Malês
Mulher preta, eu sei que é muita treta,
Viver no mundo machista onde o homem não te respeita
Ondeo ponto de vista racista menospreza a cor da tua pele
Só querem te usar pra globeleza ou mulata do Sargenteli
E quem assiste vê que a novela insisste em fazer de você,
o fetiche sacana da negra mucama na cama
ou como ama da casa grande
Seja na Record ou na Band é tudo a mesma historia,
Racismo travestido de teledramaturgia pela mesma escória
Nessa concepção idiota eu sou mais é Ruth de Souza e Zezé Mota,
Pois aqui as Filhas do Vento nunca perderam a rota!

Letra, Pavão Mc


terça-feira, 26 de agosto de 2008

O Haiti é aqui!

O Coletivo Aquilombando tem o prazer de anunciar o lançamento do seu primeiro demo clipe. O projeto foi uma parceria com a UNBTV, cuja proposta era gravar um vídeo clipe em um dia. A música HAITI foi à escolhida. O set de gravação foi a C.E.U. – Casa do Estudante Universitário, onde no ano passado, ocorreu um lamentável atentado racista contra estudantes africanos. A escolha da música, bem como o set de gravação, foi uma forma de mostrar solidariedade e levantar a auto-estima do Povo Negr@ Brasileir@ e em outras partes do mundo. Esperamos que gostem do clipe. Gostaríamos de agradecer a inestimável e solícita participação do mestrando Mancha e dos guerreiros e guerreiras do Centro Cultural de Capoeira Sol Nascente: salve quilombo!! Também agradecemos imensamente o apoio e a participação dos Irmãos Africanos: tamo juntos negrada!! Agradecemos a parceria com a UNBTV, na pessoa de Felipe Gontijo, que possibilitou essa realização. Muito obrigado a todas e a todas que direta ou indiretamente ajudaram nessa correria. Curtam o clipe e como diria o refrão da música Haiti:

“(...) pra todo povo negro que ta na linha de frente,
mantenham a corrente,
mantenham a corrente (...)”

MEU GRIÔ


Guerreiro Massai
Pavão Mc


“Prontos pra guerra,
Contra o preconceito que ainda nos emperra
Sai pro jogo com a pele forjado no fogo
Pede a bênção no pé do berimbau
Dessa vez, é pra contar a nossa versão,
Tal qual, a nação palmarina,
Do qual, o rei Zumbi foi meu ancestral
E Dandara foi a general das batalhas
Sem medalhas,
Construíram muralhas pra conter nossas glórias
Mas nossas vitórias, vem com as histórias contadas por meu avô
Ritmo e poesia com a pele da minha cor
Meu griô estampado na escrita de Leopold Sedar Sengnhor
Negritude, atitude escrita, grafitada, dançada ou falada,
Resistência arquitetada ou improvisada
Escrevo o que quero como Bantu Steve Biko e não dá nada se o berimbau tocar um corrido, uma chula, uma ladainha ou uma quadra
Sem contos de fada pro ouvinte,
Pois hip hop é o seguinte,
Válvula de escape pro candidato a pedinte
Me dê uma palavra que multiplico por vinte
Filosofia em forma de poesia é o que eu desejo
Pois meu quilombo, tem a força de Carolina de Jesus no quarto de despejo."

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

QUANTO VALE A SUA ARTE?


Ilustração em grafite, Lance, Coletivo Aquilombando.

Seguindo o raciocínio do texto anterior sobre “artivismo”, gostaria de falar sobre uma parada que ainda causa polêmica no hip hop: quanto vale a nossa arte? Quanto receber pela nossa arte? Devemos cobrar pelas paradas que criamos? Que valor devemos dar as nossas produções artísticas?

Quem nunca tirou do próprio bolso pra cantar em um baile ou festa de rap? Quem nunca caiu de buzão lá da quebrada pra animar uma festa com passos frenéticos de break? Quem nunca ficou na lona pra pintar um muro e poder mostrar o talento com as latas de tinta?

Irmãos, se nos assumimos enquanto artistas populares, devemos também ter a noção de que, assim como qualquer outro músico, artista plástico ou dançarino, a nossa arte tem um custo. Riscar uma parede e preencher o vazio de um muro com grafites tem um custo. O spray não é barato. Cada lata custa de R$ 10,00 a R$ 15,00. Imagine que para riscar uma parede com seis metros, um mano ou mina precisará de no mínimo umas dez latas. Façam as contas e vejam se não é um custo fora de algumas realidades.

Para produzir uma base instrumental em frente a um computador, pick ups ou com uma mpc, um mano gasta tempo e energia elétrica. Embora a produção musical tenha ficado mais acessível hoje em dia, a grande maioria não tem computador ou pick ups e acabam dependendo de outros produtores e dj’s. Dependendo da região, uma única base instrumental pode variar de R$ 100,00 a R$ 400,00. Depois disso, ainda existe o gasto de tempo, energia e outros recursos para finalmente gravar a voz, outros instrumentos se for o caso, mixar e masterizar a música.

O mc quando está em carreira solo, escreve geralmente três estrofes para uma música. Já imaginaram a quantidade de palavras para uma única canção. Tem “artistas” que escrevem dez linhas e são aclamados. Guardadas as devidas proporções e estilos, se o rapper escrever bem, não deve em nada pra outros compositores de outros estilos. Já cansei de ser abordado por maninhos de outras áreas que frequentemente duvidavam se eu realmente havia escrito aquela letra. Como se não fosse possível aquele neguinho ter escrito aquele conteúdo inteligente, complexo, comprometido e criativo. Fora o exercício intelectual de sentar pra escrever, ainda temos que ensair com o grupo ou banda para deixar a música apresentável.

Os b. boys e b. girls ralam muito no asfalto para aprenderem, ensaiarem e aperfeiçoarem os movimentos. Existem crews de break que ensaiam mais de 4 horas por dia. Isso porque, a grande maioria tem outro trampo e ainda não conseguem sobreviver da sua arte. Do contrário, ensaiariam muito mais tempo.

Geral, qualquer produção tem um custo. Toda vez que tem alguma comemoração ou evento em nossa cidade, quando lembram de convidar os “malucos do hip hop” para participar, o quesito remuneração quase sempre passa batido. Não que a vitrine em um evento não seja importante. Na minha opinião esse é um degral fundamental na vida do artista. E nem estou dizendo que temos que começar a capitalizar nas periferias. São pesos e medidas diferentes, o que é do gueto é do gueto irmão. Temos que entender e discernir isso. Me refiro ao desenvolvimento da consciência de recompensa do artista. Nossos produtores de eventos dentro do hip hop precisam adquirir essa consciência. Os produtores e organizadores de outros meios também precisam. E todos nós ligados ao hip hop, seja cantando, grafitando, dançando ou discotecando, necessitamos dessa consciência,
bem como torna-la uma prática cotidiana.

terça-feira, 19 de agosto de 2008

O HIP HOP E O ARTIVISMO


Fala negrada!! Pra quem não me conhece, me chamo Pavão e sou diretor executivo do Coletivo Aquilombando para a valorização da cultura negra aqui no DF. Sou mc, poeta, cantor, escritor, desenhista, filmaker, capoeira e “artivista” negro. Eu gostaria de falar mais desse último item que mencionei, o “artivismo”. Mas o que seria o artivismo? Manos e minas, trocando em miúdos, ser artivista é o que nós, envolvidos com a cultura hip hop somos. É o que fazemos. Militamos através da arte. Diga-se de passagem que essa é uma herança africana. Se pararmos para observar, todas as manifestações de resistência negra no Brasil estão ligadas a arte e vice-versa. O capoeira desafia a ordem do senhor de engenho quando troca os pés pelas mãos, ele fica fora do eixo que foi imposto. O Bumba Meu Boi e o Boi Bumba tem uma conotação de baque, o boi volta dos mortos e dá uma pancada, um “bumba” ou “bumbá” no fazendeiro que o deixou morrer. E o hip hop? Mano, como diria o Japão do Viela 17:”Hip Hop é isso, é todo o dia e toda hora, é ir pro trabalho, é pegar baú lotado, é chegar cansado em casa, tomar umas com os amigos no bar(...)”. Nos divertimos quando estamos no baile, mas as nossas ações antes e depois do baile é o que realmente nos ligam ao verdadeiro hip hop. Fazemos arte da nossa vida, criamos música com as nossas histórias de vida, damos ritmo ao corpo com os nossos movimentos, pintamos os muros com as nossas idéias e símbolos. Tem uma geral que não partilha da mesma idéia. Certa vez fui a uma entrevista que o GOG deu ao senador Cristóvão Buarque. Em uma das perguntas o senador perguntou ao GOG se o hiphoper era um artista. A resposta do irmão foi alta e clara:” quem faz hip hop não pode ser artista!”. Respeito o GOG, uma das ótimas cabeças do hip hop nacional, mas discordo em número, gênero e grau. Somo artistas sim. Negar isso é dar razão a antiga e preconceituosa noção de quem faz arte é só quem estudou em um banco de universidade ou tem diploma. Mesmo que na intenção de nos diferenciar da arte feita por quem está no mainstream (e não se enganem, somos muito diferentes mesmo), temos que assumir: somos ativistas sim, mas também somos artistas, produzimos arte, produzimos cultura! Não fazemos apenas arte pela arte, “temos um compromisso”, como diria Sabotage. Assumindo isso, sem vergonha ou timidez do que fazemos, daremos um passo muito importante como artivistas que somos.